Herança do cônjuge como único herdeiro necessário

Na semana passada, recebi um questionamento no meu Instagram quanto ao que acontece com os bens quando os cônjuges não possuem descendentes nem ascendentes vivos e um deles, que possui irmãos e outros parentes colaterais, vem a falecer.

De fato, costumamos falar muito da sucessão dos cônjuges em concorrência com os descendentes ou ascendentes (leia esse artigo e veja esses dois vídeos: 1 e 2), mas quase não se fala da hipótese em que o cônjuge ou companheiro herda sozinho.

Aliás, indo direto ao ponto, é isso mesmo o que acontece, se não houver testamento ou planejamento sucessório ainda em vida: aplica-se a chamada ordem de vocação hereditária, prevista no art. 1.829, do Código Civil:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente (…);

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais.

Como se vê, o cônjuge (ou companheiro, se o casal vivia em união estável, conforme entendimento do STF, que equiparou os dois institutos para fins sucessórios) sobrevivente tem preferência sobre todos os herdeiros colaterais.

É importante destacar que o regime de bens, nesse caso, não impedirá que o cônjuge sobrevivente seja herdeiro, influenciando apenas na diferenciação entre a parte do patrimônio que é considerada meação (sobre a qual, por já pertencer ao sobrevivente, não incide o ITCMD) e o que será considerado como herança.

Nesse sentido, transcreve-se decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. INVENTÁRIO. DECISÃO QUE DETERMINOU A EXCLUSÃO DOS HERDEIROS COLATERAIS. AUSÊNCIA DE DESCENDENTES E ASCENDENTES. CASAMENTO PELO REGIME DA SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS COM O CÔNJUGE SOBREVIVENTE. IRRELEVÂNCIA. ORDEM DE SUCESSÃO HEREDITÁRIA QUE NÃO SE ALTERA. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO.

(…)

No caso em tela, a de cujus não deixou ascendentes nem descendentes e o fato de ter se casado com o agravado pelo regime da separação obrigatória de bens (págs. 8/9 dos autos de origem) não tem o condão de alterar a ordem de sucessão.

Da mesma forma, ainda que a agravante tenha prestado todo o auxílio, durante a vida, à tia ou que o patrimônio amealhado seja fruto de recursos exclusivos desta, isso não retira do agravado a qualidade de único herdeiro da falecida Maria Elisete.”

(Processo nº 2280018-58.2021.8.26.0000. Desembargadora Relatora Maria do Carmo Honório. Julgado em 10 de março de 2022)

Entendemos que a decisão está absolutamente correta, pois realmente a lei estabelece que o cônjuge tem preferência sobre a herança, independentemente do regime de bens que regia o casamento.

Chama a atenção, ainda, o seguinte relato realizado pela Desembargadora Relatora, quanto às alegações da parte que recorreu ao TJSP:

“Afirma que a falecida era casada com o agravado pelo regime da separação obrigatória de bens (CC, art. 1.641, II) e, apesar de não ter deixado ascendentes e descendentes, ele não

é herdeiro necessário, pois há incomunicabilidade de todos os bens adquiridos antes e depois do casamento. Sustenta sempre ter provido os cuidados da de cujus, sua tia, e que era o desejo dela doar-lhe o imóvel em que reside. Assevera que todos os imóveis de propriedade da sua tia foram adquiridos com recursos únicos e exclusivos dela, servidora pública municipal aposentada.”

A leitura desse trecho permite que se conclua que a irresignação que deu origem à discussão judicial foi da sobrinha da falecida, que não se conformou com o fato de a herança ser destinada ao cônjuge sobrevivente, com o qual a falecida era casada pelo regime da separação obrigatória de bens.

Trata-se de um exemplo claro das injustiças que podem ser cometidas quando não há um bom planejamento sucessório. No caso, a tia poderia ter contemplado a sobrinha (presumindo-se que a narrativa é verdadeira) com até 50% de todo o seu patrimônio, bastando, para isso, a elaboração de um simples testamento, por exemplo.

Quando o autor da herança não planeja a sua sucessão, sua família costuma enfrentar diversos problemas.


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Sobre o Autor

Felipe Zaleski
Felipe Zaleski

Sócio da Raupp Advocacia Empresarial, advoga desde 2013 para pessoas físicas e jurídicas. Especializado em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET) de Santa Catarina, o autor alia o conhecimento teórico e prático adquirido ao longo dos anos nas diversas áreas do Direito necessárias à realização de um bom planejamento patrimonial, como societário, contratual, imobiliário, família e sucessões.

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