STJ permite produção antecipada de provas para justificar deserdação

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça permitiu a utilização da ação de produção antecipada de provas por um pai para justificar a futura deserdação de seu filho.

É importante ressaltar que a deserdação deve ser prevista no testamento, sendo que o testador deve indicar qual foi o ato praticado pelo herdeiro que a justifica. O código civil atualmente prevê a possibilidade de deserdação nos seguintes casos:

Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes

I – ofensa física;

II – injúria grave;

III – relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;

IV – desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.

Além disso, as hipóteses de indignidade (leia este post para entender a diferença entre os dois institutos ) também podem ser utilizadas para deserdar alguém:

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I – que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Voltando à recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, a relatora, Ministra Nancy Andrighi, fundamentou que:

“9- Na hipótese em exame, pretende-se apenas documentar as supostas ofensas que teriam sido desferidas pelo filho em desfavor do pai, tendo sido a medida indeferida por fundamentos ligados à admissibilidade e ao mérito de uma eventual e futura ação declaratória de indignidade.

10- Descabe inadmitir a medida requerida porque se pretenderia discutir herança de pessoa viva, porque a parte não possuiria legitimidade para a propor uma eventual e futura ação declaratória de indignidade, porque não haveria urgência, porque não haveria risco de perecimento da prova ou porque não haveria litígio concreto ou potencial, sob pena de violação ao art. 381, § 5º, do CPC.”

(REsp nº 2103428. Acórdão publicado em 21/03/2024)

De fato, parece-nos correta a decisão do STJ, uma vez que o ascendente possui interesse jurídico de produzir, ainda em vida, provas que poderão ser utilizadas por seus sucessores para justificar a deserdação, tarefa que não costuma ser das mais fáceis.

É importante destacar que o entendimento do STJ está, de certa forma, em linha com a proposta do anteprojeto de reforma do Código Civil, segundo a qual o herdeiro deserdado é que precisará impugnar a deserdação (atraindo para si o ônus da prova, a princípio), e não o contrário. Veja-se a sugestão do novo dispositivo legal:

Art. 1.965. Ao herdeiro deserdado é permitido impugnar a causa alegada pelo testador.

§ 1º O direito de impugnar a causa da deserdação extingue-se no prazo decadencial de quatro anos, a contar da data do registro do testamento.

Na exposição de motivos do anteprojeto, foi ressaltado que:

“A proposta institui, ainda, novas hipóteses pelas quais os herdeiros necessários poderão ser excluídos da sucessão, quer em decorrência da prática de atos de indignidade, quer seja por vontade do testador, nos casos de deserdação. Na disciplina dessa matéria, a exegese literal das disposições legais, na grande maioria das vezes, obsta a concretização da última vontade do autor da sucessão, no que tange a quem transmitir ou não transmitir os seus bens. Daí a necessidade de uma completa reformulação nas regras da deserdação, a começar por incluir o “abandono afetivo voluntário” como justificativa para ascendentes e descendentes se excluírem reciprocamente da sucessão, por meio do testamento, além de se inverter a lógica da ação de deserdação, cuja legitimidade ativa é transferida ao deserdado, a quem caberá impugnar a causa da deserdação, retirando esse ônus dos demais herdeiros, em fortalecimento e valorização do princípio da prevalência da vontade do testador.”

Até que essa bem-vinda alteração legislativa entre em vigor, a ação antecipada de provas, agora chancelada pelo Superior Tribunal de Justiça, segue sendo uma alternativa válida para aumentar a probabilidade de êxito de uma deserdação.


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Sobre o Autor

Felipe Zaleski
Felipe Zaleski

Sócio da Raupp Advocacia Empresarial, advoga desde 2013 para pessoas físicas e jurídicas. Especializado em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET) de Santa Catarina, o autor alia o conhecimento teórico e prático adquirido ao longo dos anos nas diversas áreas do Direito necessárias à realização de um bom planejamento patrimonial, como societário, contratual, imobiliário, família e sucessões.

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