STJ flexibiliza direito real de habitação em situações excepcionais

Importante ferramenta de planejamento sucessório, o direito real de habitação foi relativizado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar o Recurso Especial n. 2151939/RJ.

A Ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, entendeu que o Código Civil, ao prever, no art. 1.831, que “ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar”, pretendeu garantir o direito real de habitação apenas quando, no caso concreto, a sua finalidade principal, que seria a de servir de moradia e, ao mesmo tempo, permitir que o cônjuge sobrevivente siga residindo no imóvel em que já possui vínculo afetivo e psicológico, for de fato observada.

No caso analisado no Recurso Especial n. 2151939/RJ, a cônjuge sobrevivente recebe pensão vitalícia elevada, ou seja, tem condições de arcar com as despesas inerentes à moradia, e os herdeiros, que são os nu-proprietários do imóvel, possuem descendentes (netos do falecido) e residem de aluguel. 

Diante desse contexto, o STJ acabou afastando o direito da viúva a permanecer residindo de forma gratuita no imóvel.

O ponto mais interessante da decisão foi a proposição, por parte da Ministra Relatora, de critérios minimamente objetivos para que o direito real de habitação possa ser afastado em situações semelhantes. Vejamos o que constou na ementa do acórdão:

(…) 6. O art. 1.831 do Código Civil deve ser interpretado da seguinte maneira: (I) como regra geral, preenchidos os requisitos legais, é assegurado ao cônjuge ou companheiro supérstite o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família; e (II) é possível relativizar o direito real de habitação em situações excepcionais, nas quais devidamente comprovado que a sua manutenção não apenas acarreta prejuízos insustentáveis aos herdeiros/proprietários do imóvel, mas também não se justifica em relação às qualidades e necessidades pessoais do convivente supérstite.”

Embora a decisão não tenha sido tomada em sede de recurso repetitivo, trata-se de importante precedente a ser observado pelas famílias brasileiras, que devem observar esses critérios para avaliar os riscos, em cada caso, de relativização do direito real de habitação.

Na nossa opinião, a decisão, embora bem intencionada, pode trazer instabilidade e insegurança jurídica para os cônjuges que atualmente usufruem do direito real de habitação com base no texto literal do Código Civil.

Além disso, os critérios definidos pela Min. Nancy Andrighi são puramente econômicos, deixando de considerar justamente o vínculo emocional/afetivo que o(a) viúvo(a) possui com o imóvel, e que é um dos principais objetivos da própria existência desse instituto jurídico.

É importante observar, por fim, que o direito real de habitação é alvo de diversas mudanças no anteprojeto de Reforma do Código Civil, em trâmite no Senado, sendo as principais mudanças: (i) a exigência de que seja o único bem a inventariar (o CC atual fala em “único bem dessa natureza”); (ii) será estendido a outros familiares (“pessoas remanescentes da família parental”); e (iii) cessação do direito quando o titular tiver renda ou patrimônio suficiente para manter sua respectiva moradia, ou quando constituir nova família.

De certa forma, portanto, a recente decisão do STJ está em linha com a tendência legislativa sobre o tema do direito real de habitação.

O que você achou da decisão? Concorda com a flexibilização? Deixe seu comentário!



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Sobre o Autor

Felipe Zaleski
Felipe Zaleski

Sócio da Raupp Advocacia Empresarial, advoga desde 2013 para pessoas físicas e jurídicas. Especializado em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET) de Santa Catarina, o autor alia o conhecimento teórico e prático adquirido ao longo dos anos nas diversas áreas do Direito necessárias à realização de um bom planejamento patrimonial, como societário, contratual, imobiliário, família e sucessões.

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