Duas novidades positivas para a Holding no PLP 108/24

Na última semana, o Senador Eduardo Braga apresentou uma versão alternativa do PLP 108/2024, projeto de lei que, além de regulamentar parte da Reforma Tributária (como o Comitê Gestor do IBS e da CBS), também estabelece as normas gerais sobre o ITCMD, imposto que incide sobre doação e herança, que devem obrigatoriamente ser seguidas por todos os Estados e pelo Distrito Federal.

Dentre as diversas alterações trazidas na nova versão do projeto de lei, duas foram bastante favoráveis para os planejamentos sucessórios das famílias brasileiras, pois ampliam as possibilidades de planejamento tributário em relação ao domicílio fiscal e à utilização da holding como ferramenta para instrumentalizar a transmissão do patrimônio para a geração seguinte da família.

Domicílio fiscal

A redação antiga do PLP 108 dificultava a utilização de domicílio fiscal mais vantajoso para o recolhimento do ITCMD envolvendo bens móveis (conceito no qual se incluem as quotas de empresas – incluindo de holdings familiares), pois exigia que o imposto fosse recolhido no local onde as relações econômicas fossem mais relevantes:

Art. 184. Para fins da incidência do ITCMD, será considerado domicílio:

I – para as pessoas físicas, o local da sua habitação permanente ou, na hipótese de inexistência ou de mais de uma habitação permanente, o local onde as suas relações econômicas forem mais relevantes, o qual deverá ser informado no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), observada a legislação do IBS e da CBS; e

II – para as pessoas jurídicas, o local do seu estabelecimento principal, entendido como o local onde as suas relações econômicas são mais relevantes, observada a legislação do IBS e da CBS.

Já a nova redação prevê expressamente que, no caso de pessoas que possuem mais de um domicílio, haverá presunção, para fins de ITCMD, de que deve prevalecer aquele informado na declaração do imposto de renda:

Art. 159. É competente para instituir o imposto, relativamente a bens móveis, incluindo títulos, créditos e outros direitos e bens incorpóreos: (…) § 2° Presumir-se-á como domicílio o informado na declaração de rendimentos de que trata o caput do art. 7° da Lei n° 9.250, de 26 de fevereiro de 1995, no caso de as pessoas mencionadas nos incisos do caput deste artigo possuírem mais de um domicílio.

A questão do domicílio fiscal sempre foi – e provavelmente continuará sendo – objeto de batalhas entre o Fisco e os contribuintes, pois os Estados defendem que o domicílio deve coincidir, necessariamente, com o local em que o doador ou o de cujus efetivamente reside.

Se analisarmos literalmente o Código Tributário Nacional, contudo, é possível interpretar que o contribuinte pode escolher livremente qual será o seu domicílio:

Art. 127. Na falta de eleição, pelo contribuinte ou responsável, de domicílio tributário, na forma da legislação aplicável, considera-se como tal: (…) § 2º A autoridade administrativa pode recusar o domicílio eleito, quando impossibilite ou dificulte a arrecadação ou a fiscalização do tributo, aplicando-se então a regra do parágrafo anterior.

Na prática, a alteração do texto possibilitará que as famílias: (i) criem holdings familiares, integralizando nela imóveis de sua propriedade; (ii) escolham um domicílio fiscal mais vantajoso (como o Estado de São Paulo, que atualmente ainda possui alíquota fixa de 4% – e que em breve deverá ter alíquotas progressivas ainda menores, de 1% a 4%); e (iii) façam a doação das quotas ainda em vida, recolhendo o ITCMD para o Estado do domicílio que elegeram.

Esse tipo de planejamento sucessório e tributário será ainda mais interessante após a outra mudança no texto do PLP que mencionamos no início deste post: a base de cálculo.

Base de cálculo na doação das quotas de holdings familiares

Uma Holding Familiar é, antes de mais nada, uma pessoa jurídica. Os sócios de uma pessoa jurídica são detentores das suas quotas.

Quando a Holding passa a ser proprietária do patrimônio da família, o objeto da doação ou da herança para os sucessores são, justamente, essas quotas, e não o patrimônio em si – que permanece sendo de propriedade da pessoa jurídica.

A grande polêmica envolvendo a utilização da Holding Familiar como forma de transmissão do patrimônio para os sucessores é justamente a forma de calcular o valor dessas quotas, principalmente quando a holding é detentora de patrimônio imobiliário

Isso porque é completamente legal integralizar os bens na holding pelo valor histórico (que consta na declaração do imposto de renda do sócio), evitando a incidência do Imposto de Renda sobre o Ganho de Capital, pois o patrimônio de quem integraliza os imóveis permanece o mesmo.

Por exemplo: João possui, em sua declaração do IR, um apartamento declarado por R$ 100.000,00 (cem mil reais) no ano de 1998, e resolve integralizar esse bem em uma Holding Familiar pelos mesmos R$ 100.000,00, recebendo, em troca, cem mil quotas de um real cada uma.

Na declaração do IR do ano seguinte, João declarará que possui apenas as cem mil quotas da Holding no valor total de R$ 100.000,00, não mais o apartamento em si (pois não pertence mais a ele). Vejam que não haverá acréscimo patrimonial, pois um bem de R$ 100.000,00 foi substituído por outro (quotas da Holding) no mesmo valor.

Agora vejamos a redação antiga do PLP 108:

Art. 175. No caso de quotas ou ações de emissão de pessoas jurídicas ou no caso de empresário individual, a base de cálculo do ITCMD será determinada de acordo com as seguintes regras: (…) II – nos demais casos, a base de cálculo deverá ser calculada com metodologia tecnicamente idônea e adequada às quotas ou ações, inclusive o método técnico que contemple eventual perspectiva de geração de caixa do empreendimento, e deverá o valor corresponder, no mínimo, ao patrimônio líquido ajustado pela avaliação de ativos e passivos a valor de mercado, acrescido do valor de mercado do fundo de comércio, conforme estabelecido na legislação do ente tributante.

Se aprovada dessa forma, a lei passaria a obrigar os Estados a reavaliarem, no nosso exemplo, o apartamento de João, que certamente, no ano de 2025, vale muito mais do que os R$ 100.000,00 declarados no ano de 1998. 

Se o apartamento gerasse renda de aluguel para a holding, o método de avaliação deveria levar em consideração, ainda, a perspectiva de geração de caixa futura, método utilizado para calcular o valor de mercado de empresas operacionais para fins de fusões e aquisições, por exemplo.

Já a nova redação apresentada pelo Senador Eduardo Braga nos parece bem mais amigável:

Art. 154. Na transmissão de quotas ou ações de emissão de pessoas jurídicas ou no caso de empresário individual, a base de cálculo do ITCMD: (…) II –será calculada com base no valor patrimonial, correspondente ao patrimônio líquido dividido pela quantidade de quotas ou ações representativas do capital social integralizado, nos casos distintos do previsto no inciso I do caput deste artigo.

Seguindo no nosso exemplo, passaria a ser plenamente possível, na nossa interpretação, o pagamento do ITCMD na doação das quotas utilizando-se como base de cálculo os R$ 100.000,00 que compõem o patrimônio líquido da Holding Familiar, permitindo-se a transferência da titularidade indireta do apartamento, com total respaldo legal (caso o PLP seja aprovado com a redação acima), à geração seguinte da família, sem a atualização do valor do bem.

Cabe observar que esse tipo de planejamento tributário acaba fazendo com que a família abra mão dos redutores do ganho de capital, visto que a nova data de aquisição do bem, para esse fim, passa a ser a do momento da integralização do imóvel na holding. Ou seja, a economia com o ITCMD pode resultar em uma tributação maior do Imposto de Renda no futuro, quando a família resolver vender o imóvel.

A solução poderá ser a reclassificação contábil do apartamento para o estoque (caso não haja a intenção de mantê-lo alugado) e vendê-lo como mercadoria da holding, tributando-o como receita operacional, hipótese em que não há a tributação do imposto de renda sobre o ganho de capital. A má notícia é que a tributação desse tipo de operação passará a ser bem mais alta por conta das alterações trazidas pela Reforma Tributária, como explicamos no vídeo abaixo:

No fim das contas, a situação de cada família deverá ser analisada individualmente, realizando-se as simulações tributárias necessárias e levando-se em consideração os planos futuros de seus membros.

De todo modo, é certo que as alterações no PLP 108/24 foram amplamente positivas para os planejamentos sucessórios e tributários das famílias brasileiras.

Ficou com alguma dúvida? Deixe seu comentário!


Você já conhece o Método Próxima Geração de planejamento sucessório? Clique aqui e aprenda a evitar brigas por herança e a proteger o patrimônio da sua família.

Assine nossa Newsletter para receber, quinzenalmente, os destaques do Próxima Geração diretamente em seu e-mail!

Quer um guia prático para acessar sempre que tiver alguma dúvida sobre herança, testamento ou planejamento patrimonial e sucessório? Adquira nosso e-book!

Tags: | |

Assine nossa newsletter!

Não enviamos spam. Seu e-mail está 100% seguro!

Sobre o Autor

Felipe Zaleski
Felipe Zaleski

Fundador do Fontes Zaleski Advogados Associados, advoga desde 2013 para pessoas físicas e jurídicas. Especializado em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET) de Santa Catarina, o autor alia o conhecimento teórico e prático adquirido ao longo dos anos nas diversas áreas do Direito necessárias à realização de um bom planejamento patrimonial, como societário, contratual, imobiliário, família e sucessões.

0 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Este site utiliza Cookies e Tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência. Ao utilizar nosso site você concorda que está de acordo com a nossa Política de Privacidade.