Projeto de Lei define tributação do trust no Brasil
Foi apresentado, no final do ano passado, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 145/2022, que “dispõe sobre a lei aplicável ao trust, sua eficácia e seu tratamento tributário no País”.
É importante lembrar, antes de mais nada, que já está em tramitação o projeto que pretende criar, no Brasil, o contrato de fidúcia, que seria equivalente à figura do trust, muito utilizada no exterior em planejamentos patrimoniais e sucessórios. Já tratamos sobre esse tema aqui no blog, no ano de 2021. Clique aqui para ler o post.
O projeto recente não pretende concorrer com o anterior, e sim principalmente regulamentar o tratamento tributário a ser dado aos trusts estrangeiros, que já existem, visto que essa é uma lacuna atual na legislação brasileira.
Como ocorre em planejamentos sucessórios em geral, são três os impostos que costumam trazer dores de cabeça às famílias e contribuintes brasileiros: ITBI (imposto sobre transmissão de bens imóveis inter vivos), ITCMD (imposto sobre transmissão causa mortis e doação) e o imposto de renda sobre ganho de capital.
O curioso é que cada um deles é cobrado por um ente da federação diferente, tornando ainda mais importante o estabelecimento de regras claras para evitar disputas entre eles: o ITBI é de competência dos Municípios, o ITCMD dos Estados e o IR da União.
Não por acaso, são esses os três impostos regulamentados pelo PL 145/22.
Antes de adentrarmos nas especificidades de cada um, é importante destacar as definições que a lei traz dos “atores” envolvidos em um típico contrato de trust (que, por si só, esclarecem a lógica por trás desse instituto, caso o leitor ainda não esteja familiarizado):
“Art. 2º Para os efeitos desta lei, considera-se:
I – beneficiário: o beneficiário efetivo ou o beneficiário potencial, conforme o caso;
II – beneficiário efetivo: pessoa favorecida pelo trust e que já tenha adquirido, de forma incondicional, total ou parcialmente, direito sobre o patrimônio do trust, assim entendido o direito imediato, não sujeito a termo ou condição, de acessar qualquer parcela de ativos sob o trust, seja através de distribuições, resgates de capital originário ou extinção do trust;
III – beneficiário potencial: pessoa que poderá ser favorecida pelo trust mas que ainda não tenha adquirido, de forma incondicional, direito sobre o patrimônio do trust, assim entendido o direito imediato, não sujeito a termo ou condição, de acessar qualquer parcela de ativos sob o trust, seja através de distribuições, resgates de capital originário ou extinção do trust;
IV – instituidor: pessoa que cria o trust mediante transmissão de bens ou direitos a um trustee para a formação de patrimônio sob trust, indica beneficiários ou determina o propósito do trust, se assim desejar;
V – trust: instituto jurídico de direito estrangeiro resultante da transferência de bens ou direitos com valor econômico feita por uma pessoa física ou jurídica, designada instituidor, a um proprietário formal, designado trustee, concomitantemente ao nascimento de um direito de propriedade ou titularidade autônomo dos beneficiários dos bens ou direitos transferidos;
VI – trustee, administrador ou curador: pessoa que recebe a guarda e a propriedade formal de bens ou direitos com valor econômico integrantes do trust e assume deveres perante os beneficiários do trust e em relação ao patrimônio sob o trust.
Parágrafo único. O beneficiário poderá ser o próprio instituidor ou terceiros por ele nomeados, ou nomeados pelo trustee ou por lei.”
Podemos ver, portanto, que existem dois tipos de beneficiários: o potencial (aquele que, cumpridas determinadas condições – como, por exemplo, completar 18 anos de idade, ou se casar – virá a receber patrimônio ou rendimentos, conforme determinação do instituidor) e o efetivo.
Daí decorre a primeira diferenciação para fins tributários, no que diz respeito ao ITCMD:
“Art. 7º Para os efeitos de incidência do imposto sobre transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos, considera-se ocorrido o fato gerador, ressalvadas as hipóteses de não incidência previstas no caput do artigo 8º, no momento em que um beneficiário potencial adquire direito incondicional e imediato sobre qualquer parcela de ativos sob o trust, tornando-se beneficiário efetivo na forma do inciso II do artigo 2º.”
Assim, enquanto a condição pré-instituída não se concretizar, transformando o beneficiário potencial em efetivo, não haverá incidência do ITCMD.
Além disso, o projeto de lei prevê expressamente que a transferência do patrimônio do instituidor para o trustee também não configura fato gerador do imposto, e vice-versa, assim como os rendimentos decorrentes do patrimônio já adquirido pelos beneficiários efetivos:
“Art. 8° Não serão consideradas doações e não estarão sujeitas à incidência do imposto sobre transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos:
I – as transferências de bens, direitos e valores do instituidor para o trustee, para a formação do patrimônio do trust;
II – quaisquer pagamentos de valores ou transferências patrimoniais do trust para o instituidor;
III – quaisquer pagamentos de valores ou transferências patrimoniais realizadas pelo trust a beneficiários efetivos após a aquisição de tal condição, derivados dos direitos sobre o trust adquiridos na forma do caput do artigo 7º”
Um dos maiores benefícios proporcionados pelo projeto de lei às família, contudo, e que costuma ser o “calcanhar de aquiles” das holdings, por exemplo, é a previsão de não incidência do ITBI sobre imóveis transferidos do patrimônio do instituidor para o trustee:
“Art. 9° Transferências para o trust de bens imóveis e respectivos direitos não estarão sujeitos à incidência do imposto previsto no artigo 156, II, da Constituição Federal.
Parágrafo Único. O instrumento de constituição do trust e instrumentos a ele auxiliares que contemplarem a transferência de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis, quando devidamente legalizados, servirão como título idôneo ao registro da transmissão de propriedade.”
Por fim, no que diz respeito ao imposto de renda sobre ganho de capital, não há grandes novidades: o projeto prevê que o patrimônio pode ser transferido pelo instituidor ao trustee pelo valor histórico (constante na declaração do imposto de renda do instituidor) ou de mercado, sendo que apenas nesse último caso haverá a incidência do IR sobre a diferença entre um e outro.
Considerando que segurança jurídica costuma ser algo raro no Brasil, bem como a ausência de uma ferramenta específica (que não seja o testamento) para facilitar a sucessão no nosso ordenamento jurídico, entendemos que a aprovação do PL 145/2022 seria um belo presente para as famílias brasileiras e para todos os profissionais que trabalham com planejamento patrimonial e sucessório.
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