Receita Federal e a alienação de imóveis de Holdings Patrimoniais

Na semana passada, comentei no meu Instagram (@felipezaleski) sobre o risco de se alterar a classificação contábil de um imóvel que integra uma holding patrimonial com o objetivo de reduzir o imposto incidente na alienação (ou seja, venda) deste bem.

Isso porque a carga tributária sobre o ganho de capital (diferença entre o valor de compra e o de venda de um bem) normalmente é de 15% quando o imóvel está em nome de uma pessoa física (podendo chegar a até 22,5%, dependendo do valor do imóvel).

Se o imóvel estiver classificado como estoque, a holding pagará apenas 6,73% de imposto sobre o valor do imóvel. No entanto, se este mesmo imóvel está classificado no ativo permanente, o que é comum no caso de imóveis que geram receitas de aluguel, a tributação sobre o ganho de capital passa a ser de 34%, muito superior, portanto, quando comparado ao ganho de capital tributável na pessoa física.

Eu comentava, no meu Instagram, que a Receita Federal entendia ser fraudulenta a reclassificação contábil do imóvel para reduzir a tributação incidente na operação de venda do bem. Por ironia do destino, contudo, no dia seguinte à publicação me deparei com notícia do Jornal Valor Econômico que tratava exatamente deste tema, e com um viés positivo para as holdings: a Receita Federal alterou seu entendimento, passando a aceitar a mencionada reclassificação contábil.

Essa alteração de entendimento ocorreu por meio da publicação da Solução de Consulta nº 7/2021. Para compreender o seu real teor e implicações. contudo, torna-se necessária a leitura dos seguintes trechos:

A consulente informa que “desenvolve atividades imobiliárias consistentes na incorporação imobiliária, aquisição e venda de imóveis próprios e na locação de imóveis próprios”. Em virtude disso, expõe ser comum que, por questões de conveniência de mercado, imóveis de sua propriedade, registrados em conta de ativo não circulante, visto que geradores de receitas de aluguel, sejam posteriormente colocados à venda.

(…)

Afirma a consulente que imóveis inicialmente adquiridos para locação e, portanto, registrados em seu ativo não circulante são eventualmente postos à venda, sendo que ambas as operações (locação e venda) constam de seu objeto social. Eis a essência da dúvida formulada: se o fato de estar-se a vender não um bem do estoque, mas um bem contabilizado em conta de ativo não circulante, faz com que incidam sobre o fato as regras tributárias atinentes ao ganho de capital.

(…)

No caso em análise, a consulente afirma que, na sua atividade principal, realiza a venda e o aluguel de imóveis e que a operação descrita, a saber, a manutenção de imóveis para aluguel e posterior venda desses imóveis, é prática comum, o que denota habitualidade da operação, permitindo, assim, caracterizá-la como parte do ciclo operacional do seu negócio.

À luz das normas societárias e contábeis, depreende-se que os imóveis mantidos para aluguel e posterior venda, que integram as operações da consulente, deveriam ser classificados no ativo não circulante – investimentos, na condição de propriedade para investimento, enquanto alugados, devendo ser transferidos para o ativo circulante a partir do período que estiverem disponíveis para a venda.

Quanto à classificação contábil, a Solução de Consulta explica que:

Basicamente, a classificação de um ativo, cuja realização se dê no longo prazo (não circulante), como imobilizado ou intangível, e não como realizável a longo prazo ou investimentos, está diretamente relacionada à finalidade do ativo no contexto das atividades da pessoa jurídica. Sendo assim, se o ativo é destinado à manutenção destas ou exercido com essa finalidade, sendo corpóreo será classificado como imobilizado, sendo incorpóreo como ativo intangível.

Por fim, o documento deixa claro que a finalidade do imóvel no contexto da sociedade é fundamental para a definição quanto à possibilidade de tributar a receita advinda de sua alienação como receita operacional, ou não:

No caso do ativo imobilizado, a compreensão da possibilidade de locação a outros deve, necessariamente, considerar a característica essencial do ativo imobilizado: ele é destinado à manutenção das atividades ordinárias da pessoa jurídica ou exercido com essa finalidade. Em outras palavras, o ativo é necessário à consecução das operações da pessoa jurídica?

(…)

Por outro lado, na hipótese de a atividade principal, ordinária, da pessoa jurídica compreender a locação de imóveis próprios (terreno e/ou edificação), tem-se que esses ativos estariam no núcleo das suas operações, não exercendo, portanto, a função de contribuir com a consecução destas. Sendo assim, os benefícios econômicos deles esperados decorreriam, primordialmente, dos rendimentos a serem obtidos com a locação e não do seu uso. Neste caso, contabilmente, tais ativos devem ser considerados como “Propriedades para Investimento”, devendo ser classificados no ativo não circulante investimentos, conforme prescreve o Pronunciamento Técnico CPC 28 – Propriedades para Investimento.

(…)

À luz das normas societárias e contábeis, depreende-se que os imóveis mantidos para aluguel e posterior venda, que integram as operações da consulente, deveriam ser classificados no ativo não circulante – investimentos, na condição de propriedade para investimento, enquanto alugados, devendo ser transferidos para o ativo circulante a partir do período que estiverem disponíveis para a venda.

De acordo com o § 1º do art. 25 da Lei nº 9.430, de 1996, alhures, a alienação de ativos não circulantes classificados como investimentos, imobilizado ou intangível, devem se submeter à apuração do ganho de capital, contudo, como já comentado, desde que tal alienação não represente objeto ou atividade principal da pessoa jurídica, nos termos dos arts. 11 e 12 do Decreto-Lei nº 1.598, de 1977.

Por fim, a Solução de Consulta faz importante ressalva à possibilidade de afastamento da incidência dos impostos sobre o ganho de capital:

Entrementes, para tal interpretação o requisito fundamental é que o imóvel, a qualquer tempo, não tenha sido destinado à manutenção das atividades da pessoa jurídica ou exercidos com essa finalidade, tampouco que a obtenção de rendimentos tenha se dado de forma estranha às suas operações, inclusive no que se refere à manutenção do imóvel exclusivamente para valorização, pois, do contrário, possuirá natureza econômica e jurídica de imobilizado ou investimento, conforme o caso. Por exemplo, o imóvel que seja ou tenha sido utilizado como sede da pessoa jurídica caracteriza-se como ativo imobilizado e, portanto, o resultado positivo obtido com a sua alienação representará ganho de capital nos termos da legislação tributária, ainda que o objeto ou a atividade principal da pessoa jurídica seja a alienação de imóveis.

Concluímos, assim, que a Receita Federal permite que a alienação de imóvel de pessoas jurídicas com atividade imobiliária (na qual se enquadram as holdings) seja tributada como receita operacional (ou seja, com alíquota de 6,73% sobre o valor de venda), e não como ganho de capital (34% sobre a diferença entre o valor da alienação e o valor pelo qual o imóvel está registrado na contabilidade da empresa), desde que:

  • O objeto do contrato social seja compatível com as operações (locação de imóveis a terceiros e compra e venda de imóveis);
  • A exploração do imóvel faça parte da atividade principal da pessoa jurídica (estando no “núcleo de suas operações”), não sendo utilizado apenas para a manutenção das atividades da empresa (não podendo, por exemplo, ser o imóvel da sede da empresa, que integra o ativo imobilizado), nem exclusivamente para fins de valorização;

Entendemos que o novo posicionamento da Receita Federal sobre o tema é positivo e está mais alinhado à correta interpretação dos dispositivos legais que regulamentam a matéria. No entanto, por permanecerem ainda subjetividades importantes (como a utilização do imóvel no cotidiano da pessoa jurídica), a real possibilidade de a alienação de bens imóveis não ser considerada como ganho de capital dependerá, sempre, da análise de cada caso individualmente.

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Sobre o Autor

Felipe Zaleski
Felipe Zaleski

Sócio da Raupp Advocacia Empresarial, advoga desde 2013 para pessoas físicas e jurídicas. Especializado em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET) de Santa Catarina, o autor alia o conhecimento teórico e prático adquirido ao longo dos anos nas diversas áreas do Direito necessárias à realização de um bom planejamento patrimonial, como societário, contratual, imobiliário, família e sucessões.

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