Testamento conjuntivo: o que é e porque é proibido no Brasil

É bastante comum que cônjuges queiram deixar a maior parte do seu patrimônio um para o outro, afinal em regra boa parte das conquistas financeiras normalmente surge durante a constância do casamento e há a confiança de que a destinação a ser dada pelo(a) companheiro(a) será a melhor possível.

Pensando nisso, e considerando os custos inerentes à elaboração de testamento (especialmente o público), pode parecer uma boa ideia aproveitar o mesmo documento para estabelecer que, no caso de falecimento de um dos cônjuges, a parte disponível do patrimônio vá para o outro, e vice-versa, certo? Na verdade, não, pois a legislação brasileira veda expressamente essa possibilidade, conforme previsto no artigo 1.863, do Código Civil:

Art. 1.863. É proibido o testamento conjuntivo, seja simultâneo, recíproco ou correspectivo.

Por “testamento conjuntivo”, a lei quer dizer aquele realizado por meio do mesmo documento. O doutrinador Zeno Veloso[1] explica a diferença entre cada uma das possibilidades de testamento conjuntivo prevista pelo Código Civil:

“A proibição de tal negócio jurídico é substancial, seja o testamento simultâneo – se os dois testadores fazem disposições em favor de terceiro -, seja recíproco – se um testador favorece o outro, e vice-versa -, seja correspectivo – além da reciprocidade, cada testador beneficia o outro na mesma proporção em que este o tiver beneficiado, caso em que a interdependência, a relação causal entre as disposições, é mais intensa.”

São três os principais argumentos que justificam a proibição de que um mesmo testamento seja elaborado por duas pessoas:

  • A ilegalidade de qualquer documento em que seja objeto herança de pessoa viva (ainda que com a anuência desta, como ocorre no caso de testamento conjuntivo);
  • O caráter personalíssimo do testamento, cujo teor deve corresponder exatamente à vontade do testador, sendo nulo no caso de vício de consentimento;
  • A incompatibilidade do testamento conjuntivo com a revogabilidade, característica que decorre justamente do caráter personalíssimo do documento, que, por ter essa natureza, pode ser revogado a qualquer momento (o que seria dificultado no caso de ser permitida a elaboração do documento em conjunto com outra pessoa);

Em situação envolvendo testamento conjuntivo simultâneo, onde avô e avó haviam elaborado o mesmo testamento destinando seus bens a um neto, assim decidiu o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. TESTAMENTO CONJUNTIVO. NULIDADE. JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. AUSÊNCIA DE COISA JULGADA MATERIAL. 1. O testamento é ato personalíssimo de manifestação de vontade, sendo nulo na forma conjuntiva, pois vedada, no mesmo ato, a existência de mais de um testador. 2. O procedimento de jurisdição voluntária não faz coisa julgada material devido à inexistência de lide. 3. Recurso desprovido.

(Processo nº 20160110216442APC. Relator Desembargador MARIO-ZAM BELMIRO. Julgado em 21/09/2017)

Cabe a ressalva, aqui, que a legislação não proíbe, por exemplo, que os cônjuges se beneficiem mutuamente em seus respectivos testamentos (independentemente da modalidade), desde que realizados de forma individual, cada um respeitando os respectivos requisitos de validade para sua elaboração.

Você já sabia da vedação à elaboração do testamento conjuntivo? Concorda com a legislação nesse aspecto? Deixe seu comentário!

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[1] Disponível em <https://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/400832503/testamento-conjuntivo>. Acesso em 24/06/2021.

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Sobre o Autor

Felipe Zaleski
Felipe Zaleski

Sócio da Raupp Advocacia Empresarial, advoga desde 2013 para pessoas físicas e jurídicas. Especializado em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET) de Santa Catarina, o autor alia o conhecimento teórico e prático adquirido ao longo dos anos nas diversas áreas do Direito necessárias à realização de um bom planejamento patrimonial, como societário, contratual, imobiliário, família e sucessões.

2 Comentários

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  1. Pode- se dizer que e conjuntivo dois testamentos lavrador no mesmo dia e hora , no Cartório, pelos 2 conjugues, um para o outro, estipulando porcentagens diferentes para netos, pulando a mulher do filho falecido, ficando a maior parte da herança para um filho vivo. Seria conjuntivo estes dois testamentos sendo idênticos e na mesma data?

    • Olá, Marli!
      Se são dois documentos distintos, eu entendo que não se trata de testamento conjuntivo. Quanto ao conteúdo do testamento, é necessário verificar se houve desrespeito à legítima de um dos herdeiros necessários, lembrando que a mulher de filho já falecido não é herdeira necessária.

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